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ANTES DE QUALQUER OUTRA COISA, UM POUQUINHO DA CULTURA JAPONESA...

josé wanderley Novato-Silva

A cultura japonesa tem tradições milenares. A distância geográfica permitiu ao Japão a construção de um modelo cultural único, cujas marcas persistem mesmo com a característica dinâmica do povo de adaptar-se à evolução tecnológica, após terem feito uma espécie de Revolução Industrial no século XIX.

As crenças religiosas têm raízes no xintoísmo e budismo, mas coexistem com outras religiões, inclusive a cristã. A religião não é vista como doutrina, mas como um modo de vida. É um tipo de código moral tão arraigado que não se distingue dos valores sociais e culturais da população.

A introspecção marca a religião no Japão; aliás, de modo geral é um povo discreto no cotidiano – mais observador que comunicativo, e muito prático, no sentido de 'resolver problemas' sem fazer concessões, buscando a perfeição na execução. O budismo incentiva o aprimoramento dos indivíduos – e por isso a educação é levada em alta conta. Além disso, o respeito e a disciplina são valores que permanecem desde o tempo dos samurais.

Os japoneses se inclinam para dizer olá, despedir-se, demonstrar gratidão ou arrependimento. Curvar-se significa ter respeito, e essa é uma reverência formal muito obedecida. O país é uma monarquia; tem um imperador - e a hierarquia é também um valor, embora isso não signifique, na vida cotidiana, que os superiores tenham que ter privilégios que não tenham conquistado por merecimento.

Outra lembrança sempre que se fala no Japão está associada aos calçados que são retirados à entrada de casas, templos e outros lugares. Por tradição, os japoneses retiram os sapatos não só para dormir, mas para se assentar e para comer. Como as refeições são feitas em tatâmis, retirar os sapatos é também uma forma de manter o ambiente higienizado.

Outro ponto que mostra a essência da cultura japonesa são os jardins. Os jardins estão ligados ao budismo, embora tenham caráter funcional. O cultivo de árvores e flores é minucioso e disciplinado, como no caso do bonsai. o cultivo de flores é uma prática muito difundida.

No entanto há um outro lado que mostra um povo não tão pacato; os esportes mais associados ao Japão são o kendô, sumô, judô, karatê, jiu-jitsu e o aikidô – ou seja, artes marciais. Na verdade, o Japão é um país que ao longo da sua história entrou em guerra com vários outros povos. Não parece haver para os japoneses uma oposição entre o cultivo de flores e a dedicação às lutas – o que levou a antropóloga Ruth Benedict a escrever um livro sobre o país chamado “O Crisântemo e a Espada”.

Por ser um país sem muitos recursos naturais, pequeno e com grande população, e, além disso, que sofre com vulcões, terremotos e tsunamis, os japoneses têm que conviver intensamente, morar em habitações muito pequenas, e viver sem desperdiçar qualquer tipo de recurso. Tudo isso também influenciou o seu modo de viver - isto é: sua cultura.

Por último, mas não menos importante, um traço marcante é o coletivismo do povo – isto é: a submissão dos indivíduos aos valores e objetivos da população e do país como um todo, que são mais importantes que os interesses pessoais.

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O JAPÃO NO PÓS-GUERRA

  • O PLANO MARSHALL E A PRESENÇA AMERICANA  

  • A ADAPTAÇÃO DO FORDISMO E A IMPORTÂNCIA DE WILLIAM DEMING 

  • GESTÃO DE PESSOAS, GESTÃO DA QUALIDADE - A PERSPECTIVA DO CLIENTE, E O CONCEITO DE 'TOTAL'

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TOYOTA - ASCENSÃO DA PRODUÇÃO FLEXÍVEL

Extraído de Thomaz Wood, Jr., FORDISMO, TOYOTISMO E VOLVISMO: OS CAMINHOS DA INDUSTRIA EM BUSCA DO TEMPO PERDIDO. Revista de Administração de Empresas, FGV, São Paulo.

(...) Na primavera de 1950, o jovem engenheiro Eiji Toyoda empreendeu uma visita de três meses às instalações da Ford em Detroit. Após este período, ele escreveu uma carta para a sede de sua empresa, no Japão, dizendo singelamente acreditar que "havia algumas possibilidades de melhorar o sistema de produção".

De volta ao seu país, Toyoda e o seu especialista em produção, Taiichi Ohno, refletiram sobre o observado na Ford e concluíram que a produção em massa não poderia funcionar bem no Japão. Desta reflexão, nasceu o que ficou conhecido por Sistema Toyota de Produção - ou Produção Flexível. Junto com ele também nasceu a mais eficiente empresa automobilística conhecida até hoje.

Na década de 50, a fábrica da Toyota era localizada em Nagoya e sua força de trabalho era composta essencialmente por trabalhadores agrícolas.

Após o término da Segunda Guerra, a Toyota estava determinada a partir para a produção em larga escala. Mas, para isso, ela deveria encarar alguns problemas:

• o mercado doméstico era pequeno e exigia uma gama muito grande de tipos de produtos;

• a força de trabalho local não se adaptaria ao conceito taylorista;

• a compra de tecnologia no exterior era impossível; e

• a possibilidade de exportações era remota.

Para contornar parte das dificuldades, o Ministério da Indústria e Comércio japonês (MITI) propôs uma série de planos protegendo o mercado interno e forçando a fusão das indústrias locais, dando assim origem a três grandes grupos. A visão, obviamente, era de longo prazo.

Trabalhando na reformulação da linha de produção e premidos pelas limitações ambientais, Toyoda e Ohno desenvolveram uma série de inovações técnicas que possibilitavam uma dramática redução no tempo necessário para alteração dos equipamentos de moldagem. Assim, modificações nas características dos produtos tornaram-se mais simples e rápidas. Isso levou a uma inesperada descoberta: tornou-se mais barato fabricar pequenos lotes de peças estampadas, diferentes entre si, que enormes lotes homogêneos.

As consequências foram a redução dos custos de inventário e, mais importante, a possibilidade quase instantânea de observação dos problemas de qualidade, que podiam ser rapidamente eliminados.

E claro que tudo isto exigia a presença de operários bem treinados e motivados.

Cabe mencionar brevemente as condições das relações da Toyota com seus empregados: após a Segunda Guerra, pressionada pela depressão, a Toyota demitiu um quarto da sua força de trabalho, gerando uma enorme crise. Esta atitude teve duas consequências: o afastamento do presidente da empresa e a construção de um novo modelo de relação capital-trabalho que acabou se tornando a fórmula japonesa, com seus elementos característicos como emprego vitalício, promoções por critérios de antiguidade e participação nos lucros.

Trabalhando com esta mão-de-obra diferenciada, Ohno realizou uma série de implementações nas fábricas. A primeira foi agrupar os trabalhadores em torno de um líder e dar-lhes responsabilidade sobre uma série de tarefas. Com o tempo, isto passou a incluir conservação da área, pequenos reparos e inspeção da qualidade. Finalmente, quando os grupos estavam funcionando bem, passaram a ser marcados encontros para discussão de melhorias nos processos de produção.

Outra ideia interessante de Ohno foi possibilitar a qualquer operário parar a linha caso detectasse algum problema. Isto deveria evitar o procedimento, observado na Ford, relacionado à detecção de problemas apenas no final da linha, que gerava grandes quantidades de retrabalho e aumentava os custos. E claro que, no início, a linha parava a todo instante; mas com o tempo, os problemas foram sendo corrigidos e não só a quantidade de defeitos caiu, como a qualidade geral dos produtos melhorou significativamente.

Um outro aspecto importante, equacionado, foi o da rede de suprimentos. A montagem final de um veículo responde por apenas 15% do trabalho total de produção. Os processos precedentes incluem a montagem de aproximadamente 10.000 peças em 100 conjuntos principais. Coordenar e sincronizar este sistema é um desafio.

A Ford e a General Motors tentaram integrar todas as etapas num sistema único de comando burocrático. Além disso, uma política de vários fornecedores por peça e escolha por critério de custo era praticada. A questão é como fazer com que todos os subsistemas funcionem eficientemente com baixo custo e alta qualidade.

A Toyota respondeu a essa questão organizando seus fornecedores principais em grupos funcionais que, por sua vez, adotavam o mesmo critério com os seus respectivos subfornecedores formando, assim, uma estrutura piramidal. A relação cliente-fornecedor era de parceria e visava ao longo prazo. Os fornecedores da Toyota eram companhias independentes, reais centros de lucro. Por outro lado, eram intimamente envolvidos no desenvolvimento dos produtos da empresa.

O fluxo de componentes era coordenado com base num sistema que ficou conhecido como Just-in-Time. Esse sistema, que opera com a redução dos estoques intermediários, remove, por isso, as seguranças, e obriga cada membro do processo produtivo a antecipar os problemas e evitar que ocorram.

Outros aspectos da organização, a engenharia e o desenvolvimento de produtos, também foram influenciados pelos princípios adotados na produção. Enquanto nas companhias de produção em massa o problema da complexidade técnica teve como resposta uma divisão minuciosa de especialidades, na Toyota optou-se pela formação de grupos sob uma liderança forte, integrando as áreas de processo, produto e engenharia industrial.

Toyoda e Ohno levaram mais de 20 anos para implementar completamente essas ideias, mas o impacto foi enorme, com consequências positivas para a produtividade, qualidade e velocidade de resposta às demandas do mercado.

O sistema flexível da Toyota foi especialmente bem-sucedido em capitalizar as necessidades do mercado consumidor e se adaptar às mudanças tecnológicas.Ao mesmo tempo que os veículos foram adquirindo maior complexidade, o mercado foi exigindo maior confiabilidade e maior oferta de modelos.

A Toyota necessita hoje de quase metade do tempo e investimento de um produtor convencional para lançar um novo veículo. Por outro lado, enquanto as fábricas da Ford e General Motors procuram produzir um modelo por planta, as da Toyota fazem dois ou três.

O tempo médio de permanência dos modelos no mercado também é diferente: os carros japoneses têm um ciclo de vida inferior à metade do ciclo de vida dos carros americanos.

Sob o aspecto distribuição, os japoneses também inovaram, transferindo para a rede de vendas o conceito de parceria utilizado com os fornecedores e construindo, com isso, uma relação de longo termo. Conseguiu-se, assim, integrar toda a cadeia produtiva, num sistema funcional e ágil.

No fim dos anos 60, a Toyota já trabalhava totalmente dentro do conceito de produção flexível. Os outros fabricantes de veículos japoneses também passaram a adotar os mesmos princípios, embora não se possa falar que isso tenha ocorrido, ou ocorra, de forma completa.

O mesmo fenômeno ocorrido com os princípios fordistas-tayloristas está agora ocorrendo com os princípios toyotistas. Nos anos 80, o mundo estava no mesmo ponto de difusão da ideia de produção flexível dos anos 20, em relação à ideia de produção em massa.

Mas criar uma analogia desse tipo e concluir que a influência dos dois conceitos sobre as organizações terá grau semelhante pode ser perigosamente simples. O próprio toyotismo talvez não se reconheça quando aplicado fora das suas fronteiras originais. Ao contrário, os transplantes geográficos parecem levar a caminhos diferentes, ainda que mantenham alguns princípios originais intactos.

Ainda que não se possa duvidar da evolução e do impacto causado pelas mudanças implantadas por Toyoda e Ohno, também não é possível dissociá-las do quadro mais amplo que as gerou e as sustenta.

Por outro lado, um olhar mais crítico para este quadro talvez revele algumas sutilezas e fraquezas corriqueiramente ignoradas.

Kuniyasu Sakai, um empresário nipônico, advoga que a organização piramidal, base dos grandes grupos japoneses, guarda estreita semelhança com o mundo feudal. Para ele, a base da pirâmide, constituída por milhares de pequenas empresas e empregando a maior parte da mão-de-obra existente, faz o papel do servo, continuamente submetido a pressões para redução de custos, trabalhando com margens de lucro insuficientes e praticamente impedido de abandonar o seu clã.

Sakai considera que começam a aparecer rachaduras ameaçadoras para a sobrevivência desse sistema. As mais importantes estariam ligadas à queda relativa do padrão de devoção dos empregados às empresas. Uma mudança sensível dos padrões comportamentais e culturais, o surgimento de novas atitudes e expectativas em relação à vida e ao trabalho complementariam um quadro potencialmente perigoso.

Talvez isso seja insuficiente para abalar o sistema inaugurado pela Toyota, principalmente se contraposto aos sucessos já alcançados e amplamente estudados e divulgados.

Segundo uma visão mais ampla, o toyotismo, em essência, não seria mais que uma evolução do fordismo. Este ponto de vista encontra respaldo na análise do seu surgimento e equivale a dizer que o sistema estaria exposto às mesmas contradições básicas do seu antecessor. Sua vantagem competitiva, na comparação com o fordismo, seria uma maior adaptabilidade às condições ambientais. Mas mesmo esta adaptabilidade talvez esteja se aproximando de um limite de ruptura.

O conjunto de fatores da dinâmica social acabaria por catalisar as contradições internas da pirâmide, minando-a por dentro. Simultaneamente, este mesmo conjunto de fatores atuaria sobre o meio, enfraquecendo a capacidade adaptativa e a flexibilidade do sistema.

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